quarta-feira, 18 de março de 2015

Capítulo 8 - Afiando as Garras

Capítulo 8 - Afiando as Garras

Por mais que Eloise desejasse , os pais de Catherine não aprovaram que ela ficasse no quarto de Renan estudando.  Não fora até àquela casa para ficar enfurnada em um cômodo falando de cálculos,  estatísticas e percentuais econômicos. Seu propósito era outro. Até Cath , sua ex-amiga sabia quais eram suas intenções.  O estudo teve que ser realizado na biblioteca à contragosto da garota.  Como iria seduzir Renan entre estantes de livros? Pior ainda, era ter que suportar a presença de Cath. Mas ela daria um jeito de ficar sozinha com Renan. Quando a oportunidade aparecesse , ela saberia como agir.
O corredor que ficava paralelo à sala de estar , era parcamente iluminado.  O pai de Catherine manteve os lustres antigos , trocando apenas as lâmpadas.  Como era um local de passagem entre cômodos não era necessário ser muito iluminado.
Catherine ia na frente em silêncio.  Eloise tagarelava sem parar sobre como estava agradecida por Renan a ajudar com seus estudos.  Vez ou outra,  Catherine olhava para trás e a garota estava agarrada ao braço dele como se fosse uma trepadeira desavergonhada se agarrando aos galhos de um abeto.
A biblioteca ficava na parte leste da casa e uma de suas paredes, com largas portas de vidro dava para o jardim lateral.
Um odor de cedro invadiu as narinas.  Os passos soaram abafados sobre o carpete caramelo que cobria o assoalho.
Três paredes estavam cobertas, do chão ao teto ,  de estantes de madeira rústica repletas de livros. Tinha volumes pesados em capa dura e outros mais simples.  As lombadas contavam histórias fantásticas de mundos inexplorados , de sonhos perdidos e de conquistas realizadas. Uma das estantes apresentava volumes técnicos como Engenharia,  Mecânica e Matemática Aplicada. Ainda continha livros de história da arte , história antiga , filosofia e economia. O pai de Catherine adorava os livros e vendo que a menina se interessava por literatura,  mandou fazer uma estante só para ela. Os volumes variavam de infantis até os bibliográficos.  Renan ficou curioso em saber qual era o favorito da garota.
- Ai , que bom que tem um sofá aqui.  - meus pés estão matando.  Será que você podia fazer uma massagem neles pra mim , querido.
Catherine fez cara de vômito.  Além de fingida , ainda era descarada. Como poderia, um dia , ter confiado seus segredos a ela. Cobra peçonhenta! Ainda bem que não abriu o jogo com ela. - pensava Catherine.
Renan espalhou os livros de economia sobre a mesa de centro e pegou duas almofadas no sofá,  sentando em cima de uma delas e a outra , colicou a frente dele , do outro lado da mesa.
- Venha. Sente-se aqui. Vamos começar.
Eloise pensou em recusar, mas um pensamento a impulsionou a sentar-se defronte a ele. Com uma risadinha travessa, Eloise começou a alisar o braço direito.  Seu gesto não passou despercebido por Catherine que forcou uma tosse inexistente. 
- Então, como eu ia dizendo sobre as políticas econômicas desenvolvimentistas, elas são baseadas na meta de crescimento da produção industrial...
Renan desandou a falar de mercado econômico, capital privado e fundo de investimentos. Eloise fingia prestar atenção as explicações do garoto, mas sua atenção estava focada em outras coisas mais atraentes. Catherine estava sentada em uma cadeira de jacarandá, estilo Luís XV decorada com desenho de folhas e flores no encosto. Folheava um livro de capa dura, parecendo ser muito antigo. Era uma das primeiras edições de O Retrato de Dorian Gray que seu pai adquirira em um leilão alguns anos antes.
Ao ouvir um resmungo vindo de Renan, Cath tirou o nariz do livro e inclinou o corpo dobre a mesa para ver o que havia acontecido. A cena desenhada diante de seus olhos era de uma Eloise com olhar lânguido e um Renan corado como um tomate. Não precisou perguntar pra saber o que estava havendo. Da direção que estava, era possível visualizar perfeitamente os movimentos de pernas debaixo da mesa. Eloise, desavergonhadamente, esfregava os pés descalços no meio das calças de Renan.
- Quanta falta de respeito! - pensou ela sentindo-se incomodada. Sua primeira ação foi jogar o livro com toda força sobre a mesa. O barulho assustou Eloise que deu um gritinho e fez com que Renan se levantasse. 
O ódio com que Eloise a olhava não a incomodou. Já estava acostumada com a irritabilidade da garota, mas o silêncio de Renan era enervante. Ele era culpado de aceitar "dar aulas" para àquela garota petulante. A única coisa que faltava era os dois se bulinaram mutuamente sem se preocupar com sua presença. Mas eles não praticariam atos pervertidos na sua casa. Isso ela não aceitava.
- Ao invés de ficarem sentados, fingindo estudarem, por que não vão para um motel? Minha casa não é lugar de vadiagem! - Catherine se levantou e postou-se defronte a eles com as mãos nos quadris. Olhava para eles com arrogância, seu semblante fechando-se como um céu antes da tempestade.
Renan que segurava os livros, quase os deixou cair diante da explosão de Catherine. Eloise a olhou com desprezo e raiva. Sua amiga tinha passado dos limites. Por que não ficou em silêncio em seu quarto? Mas não! Tinha que estragar tudo! Agora, Renan não iria mais querer ajudá-la. Isso não ficaria assim. Ninguém mexia com ela e ficava impune. Cath podia ser má, mas ela sabia um jeito de dar o troco. Nunca imaginou jogar isso na cara da amiga, mas ao impedi-la de seguir adiante com seus planos de seduzir Renan, ela a obrigava a fazê-lo.
Eloise se levantou e encarou sua rival apontando-lhe o dedo indicador para o rosto de Catherine. Sabia que ela detestava esse gesto, mas não estava nem aí para o que ela gostava ou não. Sem titubear, liberou o verbo.
- Sua bruxa! Vou te contar uma coisa que está entalada há muito em minha garganta.  -  Eloise a olhava furiosa e as palavras saíram cuspidas, como farpas, de sua boca. - Cansei de fingir ser amiga de uma pessoa demente como você. A coitadinha da Cath que não tinha amigos acabou entrando pra turma mais badalada do colégio. Sabe por quê? -  Eloise virou-se para Renan e caminhou para perto do rapaz que escutava a tudo, de pé ao lado do sofá. - Renan, apresento-lhe a alma penada da casa mal assombrada ou como todos a chamam: Catherine - A Louca! Todos tem medo dela, por isso a aceitaram em seus círculos, mas eu a conheço muito bem. A mim, ela não mete medo. Pra mim você é uma fingida! Como te odeio sua ... - a garota investiu se jogando sobre Catherine enquanto puxava seus cabelos e cuspia em sua cara. 
- Chega! Eloise, saia dessa casa agora! - gritou Renan puxando os braços da garota para trás impedindo-a de arranhar o rosto de Catherine.
Eloise olhou-o com mágoa. Como ele se atrevia a ficar do lado daquela bruxa! Ela o enfeitiçara. Não havia outro motivo para ele agir assim. Renan nunca ficava bravo. Por isso gostara tanto dele. De sua alegria, seu sorriso franco, sua voz melodiosa. Ainda sentia seu cheiro amadeirado que tanto a enlouquecia quando estava perto dele. 
- Renan você não pode me tratar assim! Sou sua amiga lembra? Você disse que ia me ajudar.
- A meu ver a única que se esqueceu disso foi você Eloise. Meus tios a convidaram para esta casa e você não os respeitou. Usou de má fé para comigo e de violência com Catherine. Não vou falar uma terceira vez. Pegue suas coisas e saia agora! Não me obrigue a colocá-la na rua. -  Eloise pegou a bolsa e saiu da biblioteca pisando duro. Ao ouvir a porta bater com toda força, quase soltando as dobradiças, foi que Renan se virou para Catherine que ainda permanecia de pé, toda descabelada, sua roupa rasgada e amassada. 
- Você está bem? - perguntou inseguro.
- Se eu pudesse iria expulsá-lo de minha casa junto daquela vagabunda, mas como isso iria provocar uma guerra em minha família, vou apenas ignorar sua presença de hoje em diante. Não me dirija mais a palavra. Quando passar perto de mim, finja que não me conhece. E nunca, nunca mais entre no meu quarto sem a minha autorização! Se eu ver essa vadia na minha casa novamente, sou capaz de estrangulá-la com minhas próprias mãos. Então vá dar suas aulas de sexo em um lugar bem longe daqui! - ela espumava de ódio e mágoa por ser tão idiota e ainda acreditar nas pessoas. Mas seria a última vez que deixava que alguém a ferisse dessa forma.
- Cath, escute. Desculpe se...
- Não quero ouvir suas desculpas! Não quero ouvir sua voz! Será que você é surdo? Teria sido melhor se você nunca viesse morar em minha casa. Você não é bem vindo aqui. Eu não quero você aqui! Suma da minha frente! - berrou Catherine, as lágrimas lavando-lhe a face, os olhos vermelhos injetados de ódio.
Renan pegou suas coisas e saiu da biblioteca consternado. Catherine escorregou o corpo para o chão, encostando as costas no pé da mesa e chorou copiosamente por muito tempo. 
Um relâmpago seguido de um trovão sacudiu a casa como a somar sua raiva com o desespero de Catherine.

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